Dulce Maria Cardoso, autora do recente “O Retorno”, é uma dos nomes firmes da actual literatura portuguesa. Natural de Angola, chegará a Macau no próximo mês com expectativas sobre os autores chineses que poderá conhecer e com a memória de um antigo Império que terminava a Oriente.
Alice Pessoa
– Esta será a sua primeira viagem à Ásia e a Macau? É um lugar que faz parte do seu imaginário? Em que medida?
Dulce Maria Cardoso – Sim, será a minha primeira viagem à Ásia. Acho que Macau, o Oriente e a ideia de um Império fazem parte do imaginário de qualquer português: um sítio distante e sedutor; mas também perturbador, porque tudo aquilo a que sentimos que, de alguma maneira, pertencemos ou que nos pertence e que temos consciência que desconhecemos é sempre perturbador. Depois da descolonização dos países africanos pensar Macau passou a ser outra coisa: Macau passou a ser o Império por acabar mas com fim à vista.
– No seu último livro, “O Retorno”, trabalha sobre o tema da descolonização. Macau, ainda que de forma diferente, fez parte do ‘Império’ português. Interessa-lhe essa faceta deste lugar?
D.M.C. – Interessa-me muito. Não só por aquilo que acabei de dizer mas também porque Macau é o território do “conhecido” (devido às marcas que os portugueses deixaram) imerso nesse grande desconhecido que é a China. Tendo eu crescido em território então português mas fora do que é hoje Portugal (cresci em Luanda, Angola), será a primeira vez que vou a um sítio que também já não é Portugal mas que até há pouco foi.
– É uma das vozes mais destacadas da literatura portuguesa contemporânea. Como olha para a literatura que se produz hoje em Portugal? E noutros países lusófonos?
D.M.C. – Olho com curiosidade e expectativa. Há neste momento em Portugal bons poetas e bons romancistas. Sobre os países lusófonos não estou tão informada mas gosto de alguns autores e tenho a certeza de que há outros que gostarei de vir a descobrir. A língua portuguesa parece ser um bom veículo para se conseguir emocionar bem e para pensar bem.
– Participar num encontro como este que está a ser organizado em Macau, onde terá oportunidade de privar com autores de outros países e especialmente da China, é qualquer coisa que lhe interessa?
D.M.C. – Muito. Interessa-me o confronto com uma cultura e uma sociedade tão diferentes da minha. A essência do humano evidencia-se neste tipo de confrontos; por isso não quero deixar de tentar descobrir em que medida aquilo que me é estranho e distante se me assemelha. A minha expectativa é que, apesar da diferença evidente no superficial e supérfluo (o que traz diversidade e riqueza), descubramos uma qualquer comunhão no essencial e profundo (como seja a ideia de bem).
– Conhece ou acompanha a obra de algum autor chinês ou asiático? Parece-lhe importante que haja mais literatura de expressão portuguesa traduzida para chinês e vice-versa?
D.M.C. – Infelizmente conheço muito pouco. Alguns poetas, assim de memória Li Bai, Bai Juyi e romancistas, Gao Xingjian e Mo Yan, Yu Ha. Os que toda a gente conhece. As traduções são sempre bem vindas num sentido e no outro. Ter a possibilidade de ler um autor é sempre um grande privilégio.